domingo, 30 de janeiro de 2011

Sobre a arte de congelar pessoas


Lendo uma reportagem numa revista de grande circulação sobre o tempo que um apresentador tem no comando de seu programa em uma Rede de Televisão me deparei com um questionamento: ele está na faixa dos trinta e cinco anos bem sucedido e também produziu grandes feitos na vida pessoal e profissional.

Até aí tudo bem, caso não o comparasse com um cidadão comum: Estagnado, com mais de trinta anos, com uma profissão sem reconhecimento, sem grandes feitos, tanto na vida profissional, como pessoal. Aí me vem à pergunta:

- seria isso uma forma de congelamento das pessoas no tempo?

Essa estagnação, essa suposta incompetência, que algumas pessoas vivem no tempo e no espaço e que outras tão “glamourosamente” nos “inferioriza” a ponto de refletimos e pensarmos que estamos congelados no tempo? Sem produzir nada, sem criar nada e só reproduzindo “coisas” e pensamentos.

Pois é, foi nisso que pensei.

O cotidiano nos comprimem a uma enfadonha rotina de tarefas que, às vezes, desagradáveis e ouras nem tanto, parecem que nos obriga e nos condicionam a uma suposta “pedra de Sísifo” e transforma a nossa vida em um tormento contínuo. Quando pensamos que conquistamos algo vem sempre um problema do tamanho de nosso empenho e de nossas conquistas. E, às vezes, nem tão grande assim, mas conseguimos sem refletir, transformá-lo numa coisa gigantesca! E é isso que nos congela. É isso que nos dá a sensação de paralisia. Tanto perante a vida, quanto aos projetos realizados e bem sucedidos no nosso cotidiano que chega ao ponto de não percebemos que evoluímos e nos transformamos. Onde ficaria então a sensação de congelamento?

Não é de hoje que a Ciência tenta congelar o ser humano, nem é novidade o esforço que o homem faz pra descobrir a máquina do tempo. Pois bem, nós temos a máquina de congelamento. Ela reside na percepção que temos de determinados assuntos e reflexos sociais. A arte de congelar o ser humano está na percepção que temos que algumas pessoas já nascem prontas, plastificadas, com rótulos e expostas em vitrines de lojas e supermercados.

Homens e máquinas! Estamos vivendo um paradoxo contemporâneo que nos conduz a um pensar automático. Não nos conscientizamos de que a vida é um processo. E cada processo tem suas nuances e reflexos contínuos e harmoniosos. A vaidade e o egocentrismo exacerbado da natureza de cada um faz com que se percam a noção desse tempo e espaço reservado pela vida para saborear cada passo, cada momento, transformando assim, nossa vida e nossa figura humana, num verdadeiro super-star, num super-homem, ou qualquer coisa que nossa percepção possa compreender e distorcer da realidade, de um cotidiano comum. Sem que possamos nos comparar com reflexos midiáticos e ilusórios. Com personagens criados para o consumo, seja de produtos, como de idéias prontas e bem sucedidas. Aí sim ficamos inferiorizados, pois é impossível todos nascerem bem sucedidos e ter todas as oportunidades possíveis e asseguradas. E, enfim, ter o final feliz.

Apesar de num determinado momento histórico a Ciência tenha considerado o ser humano similar a uma máquina potenciadora de energia, sabemos hoje que interagimos com outros seres e com outras matérias e formas de energia. Portanto, máquinas sim, mas de congelamento! Congelamento das idéias!

A idéia nasce da percepção que cada um tem de si e do mundo que os rodeia, dos projetos de vida, das necessidades, e dos desejos que projetamos a cada passo ( é, a cada passo), pois o ser humano é mutável, pelo menos foi isso que me ensinaram e que aprendi nos livros. Assim seria muito contraditório pensar em congelamento humano levando em consideração a idéia de mutação. Outra projeção humana – a metamorfose ambulante – mas, não entraremos nesse mérito da mutação humana, se estamos refletindo sobre o oposto, que é a arte do congelamento.

Então de que maneira nosso cérebro congela as pessoas e nos congelamos também, ora, pois, pensando!

A sensação que temos que o tempo passou e não fizemos nada na vida em comparação a outras pessoas é puramente ilusória.

Você diria:

E daí? Todo mundo pensa nisso.

É, mas eu diria:

Pensa, mas não congelado!

Nisso reside à arte de congelar pessoas. Pois embora estejamos completamente alienados, vivendo consumindo todos os produtos fúteis e efêmeros que a contemporaneidade nos oferece, ainda assim pesamos, ou seja, não somos máquinas!

É isso que nos salva de qualquer sentença de condenação a uma máquina. E nos libertamos desse calvário, onde nos desacordamos da vida e nos comparamos com entidades e mitos humanos produzidos pela mídia.

É o mesmo pensar “alienado” que nos faz delirar no tempo-espaço da vida e do cotidiano e refletir na real, sem mascaras, luzes, e programas de retoques de computador. Acharemos assim a maneira deslumbrante e magnífica da arte de congelamento humano, mas o congelamento de entidades geradoras de fantasias. Onde possamos nos orgulhar dos nossos feitos, grandiosos pela magnitude de existir e não de refletir. Pelo ato de simplesmente acontecer, sem obrigações, importâncias e responsabilidades rígidas e impossíveis.

E assim a arte de congelar pessoas será alcançada pelo simples ato de pensar, inerente a todo ser humano(mesmo estando alienado). É democrático.

Portanto, podemos congelar pessoas pensando.

O que faz uma pessoa passar nove, dez ou vinte anos no mesmo programa de TV, na mesma emissora, com a mesma fortuna, a mesma audiência, com os mesmos mimos? Sem crises, sempre rindo, sem perder o emprego, sem ser traído pelos amigos, pelos irmãos, sem ser abandonado pela amada e sem tomar um porre no boteco? Não é um congelamento?

Pois é, a vida é mutante, assim como nós. E a arte de congelar pessoas alcança seu ápice no pensar, ou melhor no não pensar nessas bobagens que nos rodeiam continuamente sem que possamos nos livrar delas e nos faz pensar que somos inferiores, que não temos projetos bem sucedidos. E que a vida comum não tem valor, as pessoas comuns não tem valor.. Por que ela não acaba, nem começa. Ela simplesmente acontece ou congela. E nós temos a arte de congelar pessoas. Precisamos saber se congelamos os mitos ou a nós mesmos.


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